23 ago 2019 Esdras CETAD, DESTAQUE (notícias em destaque), Notícias
CAPÍTULO IV
A ATUALIDADE DA TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO
A Queda do Muro de Berlim (1989), símbolo máximo do Mundo Bipolar apresentou para humanidade um novo paradigma ideológico, político e econômico. Na América Latina, onde as disputas locais de comunistas e liberais se tornaram movimentos de resistência contra os golpes militares apoiados pelos EUA em vários países, surgiram novas formas de ação política e assinalaram novos rumos.
Segundo João Batista Libanio, esse novo cenário trouxe desafios para a Teologia da Libertação. Em suas palavras,
A pós-modernidade traz desafios à TdL. Antes de tudo, a vitória do neoliberalismo no mundo econômico e a afirmação da cultura extremamente subjetivista, hedonista, fragmentada pós-moderna pedem que se considerem os conflitos da realidade para além do simples antagonismo das classes. Surgem movimentos sociais de amplitude mundial de caráter transclassista, transcultural, transétnico, transexual, transreligioso, de gênero que configuram novo quadro sócio-político, econômico, cultural e religioso. Deslocam-se as preocupações para o eclodir de problemas culturais e religiosos, em íntima relação com as estruturas da sociedade. (Libanio, 2016)
Vale lembrar que a aproximação aos grupos oprimidos não se deu apenas nesse novo cenário. A teologia da libertação sempre teve como base a forte aproximação aos grupos segregados, praticamente em sua gênese existe a proposta de reflexão e luta das classes e grupos perseguidos e desvalorizados.
Com esse novo cenário porém, a teologia da libertação se apresentou bastante flexível se adaptando as questões mais sérias em cada país e se aproximando dos novos agentes sociais em seus diversos anseios e enfrentamentos.
Sendo assim, é bastante comum encontrar autores que não tratam a Teologia da libertação como “una”. Nas palavras de Michel Löwy, temos:
Proponho chama-lo [o movimento da Teologia da Libertação] de cristianismo da libertação, por ser esse um conceito mais amplo que “teologia” ou que “Igreja” e incluir tanto cultura religiosa e a rede social, quanto a fé e a prática. Dizer que não se trata de um movimento social não significa necessariamente dizer que ele é um órgão “integrado” e “bem coordenado”, mas apenas que tem, como outros movimentos semelhantes (feminismo, ecologia, etc.), uma certa capacidade de mobiliar as pessoas ao redor de objetivos comuns. (Löwy, 2000)
Contudo, a queda da URSS e de certa forma um descrédito ao modelo marxista acabaram por criar um espaço de divergência no âmbito da Teologia da Libertação. E, dessa maneira, a oposição ao modelo passou a ganhar mais expressão e hoje representa forte crítica, tanto em meios eclesiásticos quanto leigos.
Portanto, atualmente temos a Teologia da Libertação assumindo novas causas e objetos e abandonando alguns pontos mais radicais de sua agenda, especialmente no que tange a igreja católica e a própria teoria marxista.
É claro que a forte oposição da Igreja institucional, verificada na perseguição aos principais Teólogos da libertação e nas encíclicas contrárias as bases teológicas também colaboraram para uma reorganização da Teologia da Libertação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Depois de mais de 50 anos de desenvolvimento, é possível perceber que a Teologia da libertação segue viva, apesar de se reinventar e ter novos rumos.
Tomando por base a importância dos Movimentos como a Juventude Universitária Católica (JUC), a Juventude Operária Católica (JOC), a ACO, em particular nos anos de 1960 e 1970, a Teologia da Libertação se aproximou do referencial teórico do Marxismo e buscou na luta de classes uma aproximação com as causas populares da América.
Assim, depois de vários anos de luta, a Teologia da libertação contribuiu para entendermos o conflito entre a Igreja e o regime militar no curso dos anos de 1970, assim como, a partir de 1978, o espetacular surgimento de um novo movimento das classes subalternas, dos trabalhadores da cidade e do campo: o Partido dos Trabalhadores, a Central Única dos Trabalhadores e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Com efeito, uma grande parte dos militantes e quadros dirigentes dessas novas organizações vêm das CEBs e pastorais populares, e é no cristianismo da libertação que se encontra a motivação primeira de seu compromisso social e de sua mística política.
Uma das principais contribuições ideológicas do cristianismo da libertação é a integração, em maior ou menor grau, segundo os casos, de elementos fundamentais do marxismo. Obviamente, existe uma grande diversidade neste terreno, indo desde a desconfiança ou a hostilidade de alguns até a explícita auto definição de grupos ou indivíduos como “cristãos marxistas” – passando por várias formas de prudente e implícita utilização de alguns aspectos.
A descoberta do marxismo pela esquerda cristã não foi um processo puramente intelectual ou universitário. Seu ponto de partida foi um fato social evidente, uma realidade massiva e brutal no Brasil: a pobreza. O marxismo foi escolhido porque parecia oferecer a explicação mais sistemática, coerente e global das causas desta pobreza e, ao mesmo tempo, uma proposta radical para sua supressão. Para lutar de forma eficaz contra a pobreza, e superar os limites da visão caritativa tradicional da Igreja, era necessário compreender suas causas.
Dessa forma o movimento da Teologia da Libertação se construiu como uma vertente mais humanizada do cristianismo na América Latina e atingiu diretamente as diversas necessidades do povo.
Porém, a partir da década de 1990, com anos de luta e forte oposição da própria igreja institucionalizada a teologia da libertação teve que achar novos caminhos e se transformou em um movimento bastante pulverizado.
Mas, é de suma importância compreender a importância da teologia da libertação e de seus teólogos frente as ditaduras e regimes totalitários que varreram a América Latina. No Brasil, por exemplo, expoentes da Teologia da libertação enfrentaram duramente a Ditadura Militar e se posicionaram de maneira crítica e ativa contra tais movimentos.
Dessa forma, é conclusivo que a Teologia da Libertação representa uma fé ativa, voltada para entender a situação dos oprimidos como forma de enxergar o evangelho verdadeiro. E por essa razão, se fez importante na história do Século XX como alento, instrumento e arma diante dos abusos e desvios da humanidade em sua ânsia por domínio e poder, exemplo claros do que precisava ser combatido por esse “cristianismo à esquerda” apresentado pela Teologia da Libertação.
REFERÊNCIAS
Albuquerque, F. d. (31 de 02 de 2017). Dom Total. Fonte: https://domtotal.com/noticia/1138897/2017/03/a-teologia-da-libertacao-e-a-ditadura-civil-militar-no-brasil/
Boff, L. (09 de 08 de 2011). Leonardoboff.com. Fonte: leonardoboff.worldpress.com: https://leonardoboff.wordpress.com/2011/08/09/quarenta-anos-da-teologia-da-libertacao/
Carvalhaes, C., & Py, F. (16 de Janeiro de 2018). Koinonia. Fonte: http://koinonia.org.br/periodicos/theologia-publica/theologiapublica-teologia-da-libertacao-no-brasil/6018
Dussel, E. (1981). História da Teologia na América Latina. São Paulo: Edições Paulinas.
Hofstätter, L. O. (2003). A concepção de pecado na Teologia da Libertação. São Leopoldo: Nova Harmonia.
Libanio, J. B. (21 de 05 de 2016). 40 anos da Teologia da Libertação: ontem e hoje. Fonte: http://www.jblibanio.com.br
Löwy, M. (2000). A guerra dos deuses: religião e política na América Latina. Petrópolis: Vozes.
Torres, Fabella. (1982). Duas perspectivas teológicas: teologia da libertação e teologia progressista. São Paulo: Paulinas.
Westphal, E. R. (2011). Uma Breve História da Teologia da Libertação: Um olhar crítico sobre os primeiros 20 anos. Revista Teológica Brasileira, 68-98.
LEITE, Jonathan de Souza. A teologia da libertação: fé, política e luta. Monografia apresentada na conclusão do Curso de Teologia da Unar – Centro Universitário de Araras “Dr. Edmundo Ulson”: 2019.
Sobre o autor:
Membro da Assembleia de Deus – Belém – Campo de Limeira, em Artur Nogueira, Jonathan é formado em ciências sociais pela Unesp, com especialização em ensino de história. Ele é graduando em Teologia pela UNAR e bacharel em teologia pelo Cetad. Jonathan é Professor de história, filosofia, sociologia e teologia.